Lanciano é uma cidadezinha perto da costa adriática italiana, situada a uma meia-distância entre San Giovanni Rotondo (a cidade em que São Pio de Pietrelcina viveu a maior parte de sua vida) e Pescara, quase aos pés dos Apeninos. O próprio nome da cidade, "Lanciano", quase que parece antecipar o milagre que viria a ocorrer ali, mais tarde.
Com efeito, a cidade que originalmente se chamava Anxanum, teve seu nome mudado para Lanciano, em referência a um filho seu ilustre: o centurião Longinus, aquele mesmo que feriu Jesus com uma lança, na cruz. A narração do Evangelho da crucifixão diz que ao ser golpeado pela lança, o coração de Jesus verteu sangue e água, que, segundo antiquíssima tradição, tocaram um dos olhos de Longinus, devolvendo-lhe a visão (era cego de um olho).
No século VIII, havia na cidade uma comunidade de monges de São Basílio, que viviam no mosteiro de São Legoziano. Entre eles, havia um que vivia assaltado por dúvidas quanto à presença real do Corpo e do Sangue de nosso Senhor Jesus Cristo na hóstia e vinho consagrados. Suas dúvidas, certamente alimentadas em segredo, acabaram por minar lentamente sua fé.
Certa manhã, atormentado violentamente por tais dúvidas e em plena celebração da santa missa, aquele monge deu início à consagração do pão e do vinho e o que viu, então, fê-lo ficar imóvel um bom tempo, contemplando o altar, para a admiração dos fiéis que assistiam a missa. Então, virando-se para o povo, aquele sacerdote disse-lhes:
"Felizes as testemunhas que, para confundir a minha falta de fé, Deus escolheu para revelar-se a si mesmo neste bem-aventurado Sacramento e torná-Lo visível aos seus olhos".
O pão tinha se transformado em carne viva e o vinho em sangue, ante os olhos daquele sacerdote assaltado pela incredulidade. Mais uma vez, o coração de Jesus, cujo sacrifício a missa tinha renovado naquele momento, realiza o mesmo milagre feito na cruz: no Calvário, o centurião, vendo os sinais inequívocos que se seguiram à morte de Jesus, teve que reconhecer nele o Filho de Deus; aquele sacerdote, diante daquele daquela carne e sangue, retomou a sua fé e pôde dizer, como Longinus, eis o Filho de Deus.
O relato deste milagre estupendo atravessou os séculos e as relíquias, ou seja, a hóstia parcialmente transformada em carne e o vinho tornado sangue, foram guardados em um relicário de marfim, colocado sobre o altar lateral da igreja. Em 1713, a hóstia passou a ser guardada numa custódia de prata e o sangue num cálice de cristal, peças que são mantidas até os dias de hoje.
Em 1574, um novo sinal: o sangue, ao se coagular, tinha se separado em cinco partes de tamanhos e formatos diferentes, como ainda hoje pode ser visto. Ao se examinar aqueles pedaços coagulados, notou-se que qualquer um deles apresentava o mesmo peso dos outrose qualquer combinação entre eles também pesava o mesmo que cada peça individual e as cinco peças juntas. Tal fato foi então aceito pela Igreja local como um sinal de autenticidade do milagre narrado oitocentos anos antes.
Em 1672, o Papa Clemente X declarou privilegiado o altar do milagre eucarístico e em 1887 o arcebispo de Lanciano obteve do Papa Leão XIII indulgência plenária perpétua a quem venerasse as relíquias durante os oito dias que antecedem o dia da festa.
Em 1970, os frades menores conventuais, sob cuja guarda se mantém a igreja do milagre (desde 1252 chamada de São Francisco), decidiram, devidamente autorizados, confiar a dois médicos de renome profissional e idoneidade moral indiscutíveis, a análise científica das relíquias. Para tanto, convidaram o doutor Odoardo Linoli, chefe de serviço dos Hospitais Reunidos de Arezzo, Itália, e livre docente de anatomia e histologia patológica e de química e microscopia clínica, para, assessorado pelo professor Ruggero Bertelli, professor emérito de anatomia humana normal na Universidade de Siena, proceder aos exames.
Em 4 de março de 1971, os pesquisadores publicaram um relatório contendo
o resultado das análises:
a) a carne é verdadeira carne, o sangue é verdadeiro sangue;
b) a carne é do tecido muscular do coração (miocárdio, endocárdio e nervo vago);
c) a carne e o sangue contém o mesmo tipo sanguíneo, do grupo 'AB'; e
d) foram encontrados no sangue minerais (fósforo, magnésio, potássio, sódio
e cálcio, entre outros) e proteínas na mesma proporção encontrada no sangue
e carne frescos.
A conservação da carne e do sangue deixados em seu estado natural durante treze séculos e expostos à ação de agentes atmosféricos e biológicos, permanece um fenômeno sem explicação.